Medos de Catarina

Ansiava para encontrar novidades de Catarina, essa doce menina. Já estava desesperado pra saber por onde ela andava. Eu até pensei, preocupado, que aquele papel encontrado no meio da rua não era obra do acaso, e sim de uma mente perturbada e solitária.

Tive medo de que Catarina não existisse, mas os medos de Catarina são maiores que o meu. Pude descobri-los após longa procura, ao avistar, na rua, cheia de pétalas de flores que caíam das árvores, mais uma carta de Catarina, que me encanta dia após dia.

medo de ficar sozinha

sabe, não sou assim tão sozinha, tenho meus gatos e minhas manias. e uma das boas manias é a de conversar com meus bichanos. eles até se fazem de interessados em minhas histórias, mesmo lambendo seus longos pêlos. tenho dois gatinhos, sendo Clara a mais velha e Escuro o mais novo. não, Clara não é clara: ela é escura. já o Escuro é escuro mesmo.

tenho medo de perder meus gatos, de não ter com quem conversar, de ficar sozinha. sei que gatos não são humanos, mas os meus me ouvem e não me questionam. colegas de classe em minha escola constantemente me questionam sobre isso e aquilo: não confio nelas para contar meus segredos, meus anseios, meus amores e meus sonhos. às vezes recorro a algumas meninas em busca de atenção, mas no fundo o que eu quero é que Escuro me responda se um dia serei amada como Clarice foi em vida.

faço pose de que posso viver sozinha, mas toda mulher espera por um amor que a ensine a amar.

é isso: não basta ser amada, quero aprender a amar.

medo de não ser amada

esse medo me impede de me aproximar de alguém. sou tímida, sou feia, sou gordinha, sou míope e só sou feliz por viver neste século por causa da tecnologia e dos avanços da ciência e da medicina. posso corrigir minha miopia, posso fazer plásticas, posso entrar em um regime controlado. mas não há nada que conserte essa minha timidez compulsiva.

já tive um relacionamento fracassado, com o Paulo. nas ele só deve gostar de mim e nada além disso: não é amor quando não há amor.

a gente ficou algumas vezes não faz muito tempo, mas acho que ele considera “as outras” mais interessantes do que eu. raios! elas são tão bonitas, com seus longos cabelos tratados, alguns escuros, outros loiros ou coloridos. elas trabalham, elas têm dinheiro, elas têm carros e fumam Free. e o que eu sou? não posso nem dizer que sou mais inteligente, pois isso é relativo. o que eu sei de arte, não sei de economia. e o que eu tenho? tenho um quarto vazio, um computador fajuto, meus gatos e minha timidez.

medo de amar sem ser correspondida

‘Brilho eterno de uma mente sem lembranças’ é um dos meus filmes favoritos. tem uma das mais marcantes cenas que já assisti, com Joel Barish dizendo a si mesmo algo como ‘por que eu tenho essa maldita mania de me apaixonar por qualquer mulher que me dê um pouco de atenção?’. eu sou meio assim, logo me apaix

Infelizmente, a carta de Catarina acabou nesta parte.

Busco fragmentos de suas escritas todos os dias, sonhando um dia encontrá-la.

É incrível, mas todos estes medos de Catarina também são meus.

Falta-me coragem para buscá-la.

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