Meu velho amigo, o gordinho de outro estado, me recomendou esse filme há uns 10 dias, mas só pude assisti-lo sábado. Deveria ter visto antes.
“É a sua cara, me lembrou bastante de você”, disse ele. Ok, então sou um grande mentiroso? Justo eu?
Mas não se trata (só) de mentiras. Pois é claro que um filme sobre a invenção da mentira teria a invenção da religião, a invenção de um ‘homem no céu’, e como pessoas não enxergariam a ‘verdade’ puramente por conveniência.
O genial Ricky Gervais, que no filme é Mark Bellisson, é um escritor frustrado (ha!) que conseguiu mentir num mundo onde não há mentiras. Não há sequer a palavra ‘mentira’. Ele a inventou. E ninguém é capaz de entender isso, pois todos só dizem a verdade – doa a quem doer (e às vezes doi mesmo).
É como se houvesse um bloqueio mental para não mentir (e, depois, para ninguém entender por que razão alguém não diria a verdade). As pessoas se tornam ríspidas e muito, muito sinceras. Se elas não gostam de você, elas dirão isso. Na sua cara.
O filme é bem medíocre, uma fraca historinha de amor com a clássica tentativa de dar uma lição de moral. Mas as sacadas são geniais.
Ao ver sua mãe morrer triste por saber que a morte ‘é uma eternidade de nada’, Mark mente ‘vendendo’ a ela uma imagem do paraíso, com muito amor, felicidade e uma mansão para cada uma das pessoas.
Sua mãe, então, morre feliz. A cena é bem dramática, na verdade, pois Mark sabe que é mentira. Mas o médico e as enfermeiras que cuidavam da paciente ouvem tudo e logo pensam que Mark é alguém que sabe tudo sobre a morte. Lembre-se: as pessoas sempre vão acreditar no que você disser.
O povo logo pressiona Mark para saber o que de fato há depois da morte. Ele tenta corrigir seu ‘erro’ criando uma espécia de ’10 mandamentos’, dizendo que conversa com o ‘homem do céu’, o responsável por tudo de bom (e ruim) que acontece na terra.
Não digo o que acontece para não estragar o filme, pois as piadas com a religião são geniais: já perto do fim do filme há uma igreja, que é chamada de ‘lugar calmo e tranquilo para conversarmos sobre o homem do céu’.
Um religioso extremo jogaria água benta ou expurgaria os demônios do filme (depende da religião, claro). Um religioso comum apenas veria piadas. Eu enxergo várias e várias ironias. Mas, infelizmente, o mundo é todo de religiosos comuns que não percebem que acreditam numa grande mentira.
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E se realmente não pudéssemos mentir?
Não daria certo.
Na verdade, já não deu. Se vocês bem lembram, a primeira versão da Matrix era assim, uma utopia, todos felizes. De acordo com o Agente Smith, não deu certo. Não aceitamos esse mundo, recusamos viver assim.
Mas eu gostaria de tentar novamente.